sábado, 28 de novembro de 2009

Les chemins


Ela se preocupava só com o que vivia dentro dela.ELe, com a imagem projetada aos olhos famintos de outrem.Preferia o silêncio, por fazer de sua alma feminina casta, fugindo do fel das palavras.Lembrava uma frase de Hobbes, dizia que verdadeiro e falso são atributos da linguagem, onde não há linguagem, não há verdade nem mentira.Achava que queria dizer linguagem falada.A linguagem dos olhos lhe agradava profundamente. Ele, pelo contrário, admirava as falácias pertinentes ao puxa-saquismo.Fazia "média" com Deus e o mundo, só pra auto afirmar identidade etérea. Criava história fictícias tão convincentes que ele mesmo chegava a acreditar. Era simpático. Um vencedor. Homem admirável.Ela contentava-se em agradar a poucos, com o muito que tinha a oferecer. Guiado pela aparência, não se deixava abater com o fim de relacionamentos. Chorava uma crise mundial que nem mesmo sabia do que se tratava. Fazia reverências a ídolos que nem eram seus. Ela chorava o sentimento, tinha um quadro com o rosto de Helen Keller pendurado na parede do quarto. Admirava os admiráveis. Ele era cantiga de escárnio disfarçada de romantismo. Ela era filosofia,encanto, poesia de Vinicius. E nem tentava parecer.Se ela gostava da frase de Hobbes, e a interpretava sabiamente, ele preferia maldizer Adorno.O homem estabelece-se na imitação. só sendo homem ao imitar outros homems.E era assim que agia, com sorriso no rosto na roda de amigos.Nem sabia mais quem era. As unhas dela eram roidas, o cabelo nem sempre estava impecável.Vivia e sorria, cantava e amava.Ele sempre preocupado, morreu de infarto, deixando a familia lembrando de quando os olhos do filho ainda brilhavam.Já ela, morreu da idade, deixou saudades pela pessoa que era.
São raros os que encontram na fragilidade da autenticidade um porto seguro. Comuns os feitos de pura imagem.Impermeáveis por fora e alagados por dentro. Tristeza perder o melhor de si, para tentar agadar a todos, e mesmo assim, não conseguir.

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